Recuo ou estratégia de negociação? Por que Trump pausou aumento de tarifas

Economia




Os EUA agora estão sendo gentis — ou pelo menos mais gentis — com nações que enfrentaram seu ataque comercial retaliatório. Trump anunciou uma ‘pausa’ de 90 dias na aplicação de tarifas extras a países que não retaliaram sua nova política de comércio
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Durante dias, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e sua equipe da Casa Branca insistiram que estavam totalmente comprometidos com a decisão de impor tarifas “recíprocas” abrangentes a dezenas de países. Eles chegaram até a ridicularizar uma reportagem na terça-feira (08/04) que dizia que o presidente estava considerando uma pausa de 90 dias na cobrança das tarifas — notícia que desencadeou uma breve alta no mercado de ações.
Mas agora esta pausa nas taxas tarifárias mais altas, com algumas exceções notáveis, é uma realidade. A reformulação da ordem econômica global está em suspenso, e a promessa de Trump de uma era de ouro da manufatura americana vai ter que esperar.
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A Casa Branca afirmou que o plano desde o início era impor tarifas altas e depois dar uma pausa antes de iniciar negociações com países individualmente.
“Mais de 75 países entraram em contato conosco, e imagino que, depois de hoje, haverá mais”, declarou o secretário do Tesouro, Scott Bessent, a jornalistas logo após o anúncio.
Essa formulação da Casa Branca não é surpreendente, é claro. E é difícil ignorar o pânico dos investidores, a queda no mercado de títulos, o coro crescente de críticas republicanas e a desaprovação pública que precederam o anúncio.
Mas, afinal, foi um recuo estratégico diante de uma resistência inesperada ou mais um exemplo da estratégia da “arte da negociação” de Trump em ação?
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Não demorou muito para que os assessores de Trump — muitas das mesmas pessoas que disseram que ele jamais recuaria — se dispersassem e comemorassem a decisão do presidente.
Peter Navarro, assessor comercial de Trump, disse que a situação tarifária do presidente “se desenrolou exatamente como deveria”.
“Vocês claramente não conseguiram ver o que o presidente Trump está fazendo aqui”, afirmou a secretária de Imprensa, Karoline Leavitt, a um grupo de jornalistas reunidos. “O mundo inteiro está ligando para os Estados Unidos da América”.
Eles foram menos claros sobre os detalhes da suspensão das tarifas de Trump, anunciada por meio de uma postagem em sua plataforma Truth Social.
A trégua em relação às tarifas mais altas se aplicava à União Europeia? O México e o Canadá, que haviam evitado as tarifas básicas originais de 10%, foram de alguma forma incluídos agora? As tarifas direcionadas a setores específicos foram afetadas?
No fim das contas, a Casa Branca acabou esclarecendo algumas destas questões — mas durante horas os parceiros comerciais dos EUA tiveram que analisar a postagem de Trump na plataforma Truth Social e obter detalhes a partir das respostas às perguntas feitas por grupos de jornalistas.
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Na tarde de quarta-feira, Trump reconheceu que os mercados pareciam “bastante abatidos” e que “as pessoas estavam ficando um pouco nervosas” — um reflexo que minou parte da bravata que ele expressou na semana passada, e pode sugerir o verdadeiro motivo da sua mudança de curso em relação às tarifas.
No início do dia, ele estava na plataforma Truth Social, pedindo às pessoas para “manterem a calma!” e prometendo que “tudo vai dar certo”. E, na segunda-feira, ele atacou o que chamou de “panicans” — um partido baseado em “pessoas fracas e estúpidas” que não tiveram paciência com seus esforços.
Por fim, foi Trump quem adotou uma mudança abrupta de rumo.
Ele insistiu, no entanto, que seu anúncio de tarifas era algo que precisava ser feito, e que qualquer distúrbio econômico refletia uma enfermidade que havia sido autorizada a se alastrar na economia americana.
Os democratas, por sua vez, pintaram um quadro menos otimista. O líder da minoria no Senado, Chuck Schumer, acusou Trump de “governar pelo caos”.
“Ele está cambaleando, está recuando, e isso é uma coisa boa”, ele disse.
No fim das contas, o raciocínio por trás da decisão de Trump pode não ter importância.
A realidade é que os EUA agora estão sendo gentis — ou pelo menos mais gentis —com as nações que enfrentaram seu ataque comercial retaliatório, embora Trump ainda esteja impondo uma tarifa geral de 10% que, por si só, teria sido uma grande notícia há apenas algumas semanas.
No entanto, é um recuo suficiente para que o mercado de ações se recupere, e agora Trump está se voltando para uma guerra comercial com a China, que ele atacou com tarifas de 125%.
Isso vai ter suas próprias repercussões econômicas globais, mas está mais alinhado com a recente política externa americana — incluindo a do ex-presidente democrata Joe Biden —, uma vez que busca conter as ambições chinesas.
A grande incógnita, no entanto, é se as ações de Trump na semana passada — que colocaram aliados em apuros e ameaçaram a ordem global estabelecida — vão tornar essa estratégia mais difícil de ser adotada.
E em 90 dias, quando a pausa de Trump expirar, o drama econômico e a incerteza desta semana podem recomeçar.



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